Luna Lomonaco: visualizando espaços na matemática e na vida

13 de outubro de 2020

Atualizado em: 22/12/2023

Pesquisadora do IMPA é a primeira mulher a ganhar o Prêmio UMALCA

A matemática italiana Luna Lomonaco é mais produtiva de olhos fechados. É nos momentos de tranquilidade que ela visualiza mentalmente os contornos abstratos das equações que estuda e como eles se ligam às formas concretas que existem no mundo. No cinema de sua mente, a matemática tem profundidade, cores, movimento. Um rascunho disso se traduz em desenhos abstratos e detalhados nas anotações que faz nos papers que estuda. “A matemática existe para entender coisas, e para isso você visualiza; é um mundo paralelo”, explicou. 

Uma década e meia e uma coleção de experiências de vida transformadoras separam a primeira mulher a ganhar o prêmio UMALCA (União Matemática da América Latina e Caribe) da caloura que ouvia o desdém de um professor em Pádua respondendo suas dúvidas com definições repetidas do livro-texto. O começo de sua vida acadêmica se deu num ambiente muito machista e formal, ainda que metade dos alunos de matemática fossem mulheres. 

Luna precisou deixar sua universidade antes da graduação, por meio de uma bolsa Erasmus Mundus, para que pudesse redescobrir a autoconfiança matemática em contato com didáticas mais equitativas, que acolhessem a diversidade. Em Barcelona, suas dúvidas eram consideradas oportunidades de raciocínio e não desvios do currículo como em Pádua, onde a falta de incentivo ao ceticismo chegou à beira de afetar sua auto-confiança acadêmica. 

A capacidade de visualizar a matemática, talvez o mais alto nível de senso numérico, só veio no doutorado em Roskilde, na Dinamarca, em conversas com uma colega. “Ela me dizia: você consegue visualizar? E eu só via a fórmula, dizia que era cega”, afirma. Luna estudava no frio de Roskilde, na Dinamarca, quando viu uma oportunidade de pós-doutorado no Brasil. Veio atraída pelo sol. Depois de passar pela USP, hoje é pesquisadora do IMPA (Instituto de Matemática Pura e Aplicada), no Rio de Janeiro. Ela, que duvidava de sua capacidade de aprender línguas, conversou por uma hora em português perfeito. 

Luna Lomonaco foi a primeira mulher a primeira mulher a ganhar o prêmio UMALCA. Foto: Divulgação Instituto Serrapilheira

Um entrave importante que Luna vê para a descoberta de talentos matemáticos é o fato de os currículos escolares muitas vezes enfatizarem uma matemática formalizada demais, longe daquilo que desperta a curiosidade. “É como se, ao ensinar literatura, fizessem a criança primeiro decorar o dicionário para só depois ler ‘O Pequeno Príncipe’”, comparou. 

Mas não confunda o elogio à fruição do aprendizado com uma apologia da aplicação acima de tudo. Longe disso. “Quando você começa a se perguntar para que serve algo, já não vê o objeto, vê a funcionalidade que gostaria que aquele objeto tivesse”, explica. “Só que esse olhar já não é claro, é um olhar enviesado, porque você espera que esse objeto seja deste ou daquele jeito.”

Segundo ela, o ambiente da bolha acadêmica onde circula no Brasil é muito mais propício ao desenvolvimento profissional das mulheres do que aquele onde começou seus estudos. Mas muito ainda precisa mudar, ela lembra. Quando ganhou o prêmio L’Oréal Para Mulheres na Ciência (2018), ouviu a história de um pesquisador que foi procurar um kit de experiências químicas para uma menininha e ouviu na loja que o brinquedo estava na seção de meninos. 

Esse tipo de atitude, de várias maneiras naturalizada no ambiente, faz com que muitas mulheres interessadas em ciência tenham a chamada “síndrome do impostor”, ao pensar que aquele não é seu lugar. Ela conta que já sentiu isso, especialmente em Pádua. “Se lhe repetem toda vida que seu lugar não é aquele, até quando você chega àquele lugar você fica se questionando”, disse Luna. 

Gradualmente, porém, isso vem mudando, especialmente no meio onde circula, de pessoas focadas no estudo. Se há dois anos ela ganhou um prêmio voltado apenas a pesquisadoras mulheres, nos dois anos seguintes foi a primeira mulher a ganhar prêmios cujos vencedores sempre haviam sido colegas homens – o Prêmio SBM (Sociedade Brasileira de Matemática). “Minha bolhinha aqui é muito melhor do que o que sofri na Itália no começo.” 

Crédito da foto de capa: Divulgação IMPA


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