A Máquina Analítica e a pré-história dos computadores

28 de julho de 2020

Atualizado em: 22/12/2023

A evolução tecnológica acompanha nossa capacidade de fazer cálculos mais complexos. O homem começou contando os dedos, inventou o ábaco, a calculadora, a máquina analítica e chegamos ao Summit, o computador mais veloz do mundo, capaz de fazer 200 petaflops (200 quatrilhões!) de cálculos e simulações científicas por segundo. Você conhece um pouco da história da computação? Comecemos com sua “pré-história” e a importância de visionários como Napier, Pascal, Leibniz, Babbage e Lovelace. Sem eles, você não estaria lendo este texto agora.

O início de tudo

Essa trajetória começa no século 16 com John Napier (1550-1617). Mas antes de falar desse matemático escocês, é necessário lembrar das primeiras ferramentas de cálculo, como o ábaco, que tem origem provável na Mesopotâmia, ao redor de 2400 a.C. Era uma pedra lisa, coberta de areia e bolas de pedra. Muitos outros povos tinham sua versão própria, como egípcios, romanos, indianos e chineses, com suas hastes paralelas e bolinhas.

Voltando a John Napier, ele escreveu o livro Logaritmos em 1614, com o intuito de transformar cálculos aritméticos complicados em operações mais simples e auxiliar o desenvolvimento da astronomia e do comércio, que se expandia ao conquistar os oceanos. A obra descrevia os logaritmos e as regras para usá-los, e suas tabelas de funções trigonométricas foram úteis por quase um século.

“Napier inventou uma forma de fazer multiplicações e divisões com um mecanismo de bastões que reduzia essas operações a somas mais simples. Os Bastões de Napier também fizeram parte do projeto da primeira calculadora mecânica conhecida”, afirma Hallison Paz, doutorando do Laboratório de Visão Computacional e Computação Gráfica (Visgraf) do IMPA e co-criador do canal do YouTube Programação Dinâmica

http://www.inf.ufsc.br/~j.barreto/cca/arquitet/arq1.h33.jpgFigura 5 – Ossos de Napierhttp://www.inf.ufsc.br/~j.barreto/cca/arquitet/arq1.h34.gifFigura 6 – Estruturas de Napier

As calculadoras

A primeira calculadora mecânica foi construída em 1623 pelo astrônomo alemão Wilhelm Schickard (1592-1635). Usava um complexo sistema de engrenagens e hastes e realizava as quatro operações básicas com até seis dígitos. Quando chegava ao resultado, soava um sino, por isso foi chamada de relógio calculador pelo inventor.

Mas o aparelho foi um segredo por quase 300 anos. A calculadora de Schickard só foi descoberta no início do século 20, quando foram encontradas suas correspondências com o matemático e astrônomo Johannes Kepler (1571-1630), com esboços e explicações sobre seu funcionamento. Em 1960, foram criadas réplicas inspirados em seus desenhos.

Até então creditava-se a Blaise Pascal (1623-1662) a invenção da primeira máquina de calcular, a Pascalina (1642), que fazia somas, subtrações e ainda multiplicava e dividia por repetição. Era uma caixa retangular com cerca de 30 cm de comprimento e 8 cm de altura. Tinha um sistema de rodas dentadas, cada uma com algarismos de 0 a 9 e fazia cálculos até 999.999.

Com apoio do rei da França, foram construídos 50 aparelhos. Além de escritor, físico e filósofo, Pascal tornou-se um importante matemático, criador do famoso triângulo de Pascal (o Youcubed tem uma atividade divertida com este triângulo!).

Máquina de Pascal
Pascalina, primeira máquina de calcular, foi criada em 1642

Quase 30 anos depois, em 1671, o matemático e filósofo alemão Gottfried Leibniz (1646-1716) aperfeiçoou a Pascalina. Sua calculadora fazia as quatro operações, raiz quadrada e ainda tinha design inovador. Com um sistema de cilindros, bastava mover uma manivela para chegar ao resultado.

Leibniz também é o precursor do sistema binário, com zero e um, como operam os computadores modernos. Para o matemático, era “indigno de homens eminentes perder horas na tarefa desgastante de calcular”.  Em 1694, a máquina foi construída, mas apresentou muitas falhas. Um modelo funcional só surgiu em 1791, muitos anos após sua morte, em 1716. 

Invenções programáveis

Essas invenções foram importantes, mas não podem ser consideradas um computador, porque não eram programáveis. A primeira máquina a fazer isso foi o tear automático de Joseph Marie Jacquard (1752-1834), em 1801. A invenção revolucionou a produção têxtil e foi um dos marcos da revolução industrial. Usando um sistema binário, lia os cartões perfurados com o desenho e efetuava as operações na sequência programada.

O impacto econômico e social do tear fez Jacquard receber ameaças de morte, porque pequenas empresas e trabalhadores tinham medo de perder o emprego. Em protesto, algumas máquinas foram destruídas. Entretanto, em 1812, após alguns anos de ajustes, já havia 11 mil teares desse tipo na França.

O primeiro computador: a Máquina Analítica

A história da computação, como a da ciência, é resultado da cooperação entre as pessoas através dos séculos. Inspirando-se na programação, nos cartões perfurados de Jacquard e no sistema binário de Leibniz, o matemático Charles Babbage (1791-1871) inventou a Máquina Analítica, considerada o primeiro computador mecânico.

Em 1837, ele publicou artigo sobre a sucessora da Máquina Diferencial, seu primeiro projeto, similar a uma calculadora, mas que lidava com polinômios. A evolução tinha basicamente a mesma estrutura dos computadores atuais, com uma unidade de processamento de dados e outra de memória, separadas.

Os cartões perfurados eram lidos pelo dispositivo de entrada e armazenados; engrenagens e alavancas transferiam dados da memória para o processador. Era possível fazer cálculos com até 50 dígitos.

Máquina Analítica
Máquina Analítica, considerada o primeiro computador mecânico

Após a publicação do artigo, Babbage obteve apoio financeiro do governo britânico para construí-la. Seu desenvolvimento se deve à decisiva contribuição de Ada Lovelace (1815-1852), considerada a primeira programadora, por ter escrito o primeiro algoritmo para ser processado por uma máquina, em 1843, em seu livro Anotações.

“O algoritmo de Ada já apresentava as ideias presentes nos algoritmos modernos, como controle de fluxo condicional, laços repetitivos e sub-rotinas ou procedimentos. Ada também percebeu que seria possível processar qualquer tipo de símbolo em uma máquina e não apenas números”, afirma Hallison Paz.

As ideias de Babbage e Lovelace estavam muito à frente da tecnologia da época, que não concebia componentes com a devida precisão. Após 19 anos de esforços e insucessos, o governo britânico deixou de financiar o projeto e, sem dinheiro, a Máquina Analítica jamais seria concluída. Só na década de 1940, mais de um século, cientistas voltaram a se aventurar no universo computacional. 

“É importante conhecer essa história para entender como a forma de lidar com a computação e de criar programas sempre passou e vai passar por transformações. Hoje, há pessoas assustadas com a revolução que vivemos por conta da inteligência artificial. Recentemente, saíram demonstrações de uma IA capaz de escrever código para solucionar alguns problemas computacionais. Tudo isso é parte do processo de evolução que sempre existiu”, conclui Paz.

Um debate atual

Algoritmos, inteligência artificial e as questões éticas envolvidas nessas transformações serão debatidos no webinar “Ciência de dados: o futuro é agora!”, nesta quarta-feira (29), às 17h, no Facebook do Mentalidades Matemáticas.

Hallison Paz participa do encontro virtual com André Carvalho, professor e vice-diretor do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da USP (ICMC-USP) e Maitê Salinas, professora do Colégio Sidarta e formadora do Mentalidades Matemáticas. A mediação será de Marcelo Soares, jornalista e diretor da Lagom Data, consultoria de inteligência de dados. 

O webinar vai debater a importância da ciência de dados no mundo de hoje, como preparar uma nova geração para entender e analisar essas informações e também as questões éticas envolvidas no uso e na interpretação. O encontro faz parte da série de webinários “E a matemática com isso?”, iniciativa do Instituto Sidarta em parceria com o Itaú Social e apoio do IMPA. Não perca!


Mentalidades Matemáticas

    Cadastre-se para aproveitar todos os nossos conteúdos gratuitos!

    *Ao preencher o formulário, concordo em receber comunicações de acordo com meus interesses e afirmo estar de acordo com a Política de Privacidade.
    **Você poderá alterar suas permissões de comunicação a qualquer tempo.
    Prometemos não utilizar suas informações de contato para enviar qualquer tipo de SPAM.

    Mentalidades Matemáticas

      Cadastre-se para aproveitar todos os nossos conteúdos gratuitos!

      *Ao preencher o formulário, concordo em receber comunicações de acordo com meus interesses e afirmo estar de acordo com a Política de Privacidade.
      **Você poderá alterar suas permissões de comunicação a qualquer tempo.
      Prometemos não utilizar suas informações de contato para enviar qualquer tipo de SPAM.

      Mentalidades Matemáticas

        Cadastre-se para aproveitar todos os nossos conteúdos gratuitos!

        *Ao preencher o formulário, concordo em receber comunicações de acordo com meus interesses e afirmo estar de acordo com a Política de Privacidade.
        **Você poderá alterar suas permissões de comunicação a qualquer tempo.
        Prometemos não utilizar suas informações de contato para enviar qualquer tipo de SPAM.