‘Papel do cético’ incentiva argumentação e criatividade dos alunos
Atualizado em: 22/12/2023
Abordagem desenvolvida por Cathy Humphreys reforça comunidade de aprendizagem
A argumentação é a essência da matemática. Por isso, um aluno acertar um desafio não satisfaz uma classe de Mentalidades Matemáticas. Algum colega vai perguntar: “por que você usou essa estratégia?” ou “você pode explicar de outro jeito?” O aluno é desafiado a expor suas ideias até convencer a todos, produzindo um conhecimento coletivo. Esse é o papel do cético, prática pedagógica que incentiva a argumentação e aprofunda a aprendizagem.
Matemáticos provam suas hipóteses descrevendo detalhadamente seus raciocínios, a conexão lógica de suas ideias. Não poderia diferente em sala de aula. No papel do cético, abordagem desenvolvida pela educadora Cathy Humphreys, existem três níveis de convencimento. Convencer a si mesmo, convencer um amigo, convencer um cético. É mais simples convencer os dois primeiros, mas é preciso altos níveis de argumentação para convencer o terceiro.
“É um momento de exploração, quando o aluno é protagonista de sua aprendizagem e constrói uma comunidade de aprendizagem. Primeiro ele faz conexão com seu conhecimento social e potencial, e ao ser cético, desenvolve sua mentalidade de crescimento [conceito segundo o qual o cérebro se desenvolve à medida que é desafiado]. Por meio da troca de informação com seus colegas e mediação do professor, produz seu conhecimento efetivo, que é o objetivo da aula”, explica Regiane Picinin, professora do EJA (Educação de Jovens e Adultos), em São Paulo.
É uma situação desafiadora para os alunos. Questionados sobre sua estratégia, são obrigados a sair de sua zona de conforto, esforçam-se para encontrar outros caminhos, incentivando a criatividade. Há o outro lado, o do cético, que precisa entender a proposta da atividade e mergulhar na estratégia do colega para explicar sua dúvida. É necessário criar um ambiente seguro, que respeite os erros como processo de aprendizagem para que a atividade seja satisfatória.
Regiane conta que, inicialmente, os alunos respondem com negações ou evasivas, como “não sei”, “não consigo”, “porque sim”. Para ela, cabe ao professor devolver ao aluno o desafio e engajá-lo para atingir seu conhecimento efetivo e validar o saber científico. A professora do SESI em Santos, Indira Vânia Pereira, concorda. “No começo se queixam, relutam um pouco porque sabem que terão de pensar muito antes, ter as ideias claras, ser convincente. Quando se acostumam, percebem que não é nada pessoal, é construção de conhecimento através do diálogo.”
Indira afirma que o papel do cético faz com que a criança aprenda a expor suas ideias e ser mais crítica, “usando um outro linguajar, uma linguagem matemática mais apurada”. Além disso, como escreve a professora da Universidade Stanford Jo Boaler no livro Mentalidades Matemáticas, argumentar promove a equidade em sala de aula, pois ajuda a reduzir a distância entre alunos que compreenderam e aqueles que estavam com dificuldade, pois as perguntas abrem rotas matemáticas e intensificam a aprendizagem.
A prática explicita o papel do professor como mediador de conhecimento. Durante a aula, ele também é um cético, que incentiva a criatividade e a perseverança dos alunos em uma comunidade de aprendizagem. “A mediação do docente busca garantir que as hipóteses sejam detalhadas, para que todos entendam”, explica Regiane. O professor pode estimular os alunos a deixar os números e buscar alternativas geométricas, visuais ou com objetos.
Atividade do Youcubed
Na plataforma Youcubed, há uma atividade recomendada por Jo Boaler para estimular o papel do cético. Em Dobraduras de Papel, exercício criado por Mark Driscoll e adaptado pela equipe do site, os alunos são convidados a fazer dobraduras para mostrar propriedades geométricas em questões cada vez mais difíceis. Eles trabalham em duplas e se revezam entre dois papéis: dobrador e cético. Confira no Youcubed a atividade completa.
