Matemática visual desenvolve o cérebro e melhora aprendizagem

31 de março de 2020

Atualizado em: 22/12/2023

Como mudar a relação dos alunos com a matemática e oferecer um aprendizado que desperte compreensões novas e profundas? Fundamentada por estudos da neurociência, a professora da Faculdade de Educação da Universidade de Stanford Jo Boaler, criadora do Mentalidades Matemáticas, defende que a matemática deixe de ser exclusivamente numérica e abstrata e se torne flexível e criativa para ser mais bem compreendida pelos alunos. E é aí que entram conceitos como o da matemática visual. A seguir, entenda mais sobre ela.

A importância da matemática visual

No  artigo Ver para entender: a importância da matemática visual para o cérebro e o aprendizado, Boaler cita pesquisas que mostram que valorizar abordagens visuais desenvolve diferentes áreas do cérebro e amplia o raciocínio lógico. O texto começa com uma provocação sobre o hábito das crianças de fazer contas com os dedos:

“Semanas atrás, o silêncio de meu escritório em Stanford foi interrompido por um telefonema. Uma mãe me ligou para dizer que a filha de 5 anos tinha voltado da escola chorando porque a professora não a deixou contar com os dedos. Semanas depois, quando contei à minha turma de graduandos que a matemática visual era muito importante, um deles perguntou: ‘Mas só para níveis mais básicos, né?’”

A matemática Maryam Mirzakhani, que recebeu a medalha Fields, derruba essa tese. Todo o seu trabalho é fundamentado na matemática visual. Seus colegas classificam suas teorias como “lindas”, “impressionantes” e afirmam que elas unem conhecimentos antes desconectados.

Segundo o pesquisador Thomas West, “para um matemático, prescindir das imagens é masoquismo”. Outro grande matemático e divulgador da disciplina, Étienne Ghys, membro da Academia de Ciências da França e pesquisador honorário do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), dá protagonismo às imagens em suas premiadas séries de vídeos Dimensions e Chaos

Maryam Mizarkhani
Todo o trabalho de Maryam Mirzakhani, que recebeu a medalha Fields, é fundamentado na matemática visual | Imagem: Divulgação

A matemática visual no cérebro

E a neurociência está de acordo com todos esses apontamentos. Neuroimagens apontam que o raciocínio matemático baseia-se no processamento visual. O cérebro é composto por muitas áreas e rotas neurais que são ativadas e se comunicam entre si quando estudamos. Ao tentar resolver um cálculo, por exemplo, envolvemos as redes frontais, o lobo temporal medial e o hipocampo. A atividade cerebral acontece também em duas vias visuais, a ventral e a dorsal – a mais importante região do cérebro para representar o conhecimento de quantidades. 

Para desenvolver a via visual dorsal, estudos cognitivos mostraram que a representação de uma quantidade numa linha numérica é uma importante ferramenta para conhecer os conceitos matemáticos. A pesquisa indicou que as diferenças de conhecimento entre alunos de baixa renda e de classe média eram eliminadas após quatro sessões de 15 minutos de jogo com uma linha numérica. 

Linha numérica é uma ferramenta importante para conhecer conceitos matemáticos | Imagem: Reprodução

Contar usando os dedos e a compreensão da matemática 

Jo Boaler defende acabar com o estigma de que é errado usar os dedos para fazer cálculos. Para ela, é uma atividade importante e valiosa, que deve ser estimulada. Estudos comportamentais e da neurociência evidenciam que praticar e aprimorar a percepção dos dedos melhora o desempenho em matemática. As mãos são nosso recurso visual mais fácil e útil, essenciais ao desenvolvimento cerebral.

Os pesquisadores Ilaria Berteletti e James R. Booth investigaram uma parte específica do cérebro dedicada à percepção e representação dos dedos, conhecida como somatossensorial. Segundo os estudiosos, nós “enxergamos” a representação dos dedos na nossa cabeça. Em uma de suas pesquisas, quando crianças entre 8 e 13 anos resolveram subtrações, essa área foi ativada, mesmo sem o uso das mãos para contar.

Brian Butterworth, outro renomado pesquisador dessa área, afirma que se os alunos não aprendem sobre os números por meio da reflexão sobre seus dedos, os números jamais terão uma representação normal no cérebro. Entretanto, Jo Boaler faz uma ressalva: “Isso não significa continuar contando assim para sempre. Mas quer dizer que qualquer pessoa que precise contar usando os dedos, deve fazê-lo porque isso é crucial para o desenvolvimento cerebral”. 

Imagem de <a href="https://pixabay.com/pt/users/antoniusales-35941/?utm_source=link-attribution&utm_medium=referral&utm_campaign=image&utm_content=517839">Antonio Sales Sales</a> por <a href="https://pixabay.com/pt/?utm_source=link-attribution&utm_medium=referral&utm_campaign=image&utm_content=517839">Pixabay</a>
Imagem: Pixabay

Outra crença a ser combatida é que, por ser abstrata, a matemática estaria confinada somente à atividade cerebral. Os estudiosos descartam a separação entre mente e corpo. Pesquisadores de cognição corporificada – um área de pesquisa cuja premissa é que as características da cognição são moldadas por todo o corpo humano e não apenas pelo cérebro –  apontam que muitos dos nossos conceitos matemáticos são processados em memórias motoras visuais e sensoriais. Eles observam nossa postura, a maneira como olhamos e gesticulamos quando expressamos ideias matemáticas. Essas informações mostram que o conhecimento matemático também é processado pelas memórias dos sentidos. 

Resultados em sala de aula 

Jo Boaler e sua equipe do Youcubed promoveram um curso de férias do Programa Mentalidades Matemáticas por 18 dias para 81 alunos. Quando receberam os testes distritais que precisavam fazer no fim do ano letivo, 50% dos alunos melhorararam no desempenho.

Nesses cursos, em Stanford, a álgebra é ensinada visualmente pelo estudo de padrões e generalizações. Uma atividade é descobrir quantos quadrados há na borda do quadrado, sem contá-los. Os alunos descobriram diferentes caminhos para chegar à resposta. As estratégias foram descritas numérica e, depois, algebricamente (imagem abaixo). “Isso foi um recurso para estimulá-los a desenvolver generalizações algébricas. No final do curso de férias, uma menina pensou e disse: ‘Eu nunca tinha visto uma ideia matemática’”, recorda Boaler.

Alunos fizeram diferentes caminhos para descobrir quantos quadrados há na borda de um quadrado (sem contar!) | Imagem: Reprodução

A pesquisadora conclui o artigo com três recomendações:

1) Incentivar a criatividade dos alunos nas abordagens visuais e contestar que o bom desempenho de matemática depende da memorização e da velocidade de raciocínio. Bons estudantes pensam com profundidade, fazem conexões e as visualizam. 

2) Estimular o uso e o reconhecimento dos dedos. Ao impedir isso, prejudicamos parte importante do amadurecimento matemático. 

3) Estimular o ensino visual e multidisciplinar: não existe um conceito que não possa ser ilustrado. Assim, os alunos estarão mais bem preparados para o futuro do mercado de trabalho, atrelado a tecnologias de visualização de informações. 

Gostou de saber mais sobre matemática visual? Então aproveite e assista nosso webinar sobre esse tema, em que professores compartilham suas experiências usando o método em sala de aula. E se você também já testou com seus alunos, conta nos comentários como foi essa experiência!


Mentalidades Matemáticas

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