Estratégias para um ensino equitativo da matemática

05 de maio de 2020

Atualizado em: 22/12/2023

Como podemos tornar a educação de matemática mais equitativa? Essa é umas das perguntas que norteiam a trajetória intelectual de Jo Boaler, professora da Faculdade de Educação da Universidade de Stanford (EUA) e co-fundadora do Youcubed. Ela aborda o ensino equitativo em seu livro Mentalidades Matemáticas em que, fundamentada em pesquisas, recomenda romper os estereótipos sociais para oferecer um ensino de alto nível para todos os estudantes sem distinção.

Não julgar para não separar

Jo Boaler afirma que a matemática é frequentemente ensinada como uma disciplina de desempenho, cujo papel é separar os estudantes que possuem o “gene da matemática” dos que não possuem. Ela acredita que é preciso reconhecer e quebrar essa cultura elitista, que divide alunos em níveis equivocadamente e produz um mecanismo de classificação, mantendo privilégios sociais e afastando mulheres e minorias da disciplina. 

Sem ensino equitativo, mulheres e minorias são prejudicadas

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Imagem: Freepik

Por que persiste a ideia de que mulheres e minorias não têm lugar na ciência? No livro, Jo apresenta dados da disparidade nos Estados Unidos. Em 2013, 73% dos doutorandos em matemática eram do sexo masculino e 94% eram brancos ou asiáticos. As mulheres são sub-representadas na maioria das disciplinas STEM (ciência, tecnologia, engenharia e matemática), mas isso ocorre também em algumas carreiras de humanas. Nos EUA, 31% dos estudantes de filosofia são mulheres. Outras pesquisas constatam o menor número de mulheres e afro-americanos nas disciplinas em que professores acreditam que o talento natural é a principal condição para êxito. 

Aqui no Brasil o cenário não é diferente. Tratamos deste tema aqui no blog na matéria sobre o Dia Internacional de Mulheres e Meninas na Ciência. Ativa nas discussões de gênero, a matemática Carolina Araujo, pesquisadora do IMPA, cita um levantamento da pesquisadora Christina Brech, que mostra que as mulheres representam 42% dos ingressantes na graduação, 27% entre os alunos de mestrado e 24% entre os de doutorado nos cursos em matemática do Brasil.

Para mudar esse contexto, quais atitudes podem colaborar com um ensino equitativo? As obras de Jo Boaler apresentam algumas sugestões, com base em pesquisas realizadas em escolas mundo afora. Confira.

4 maneiras de investir no ensino equitativo 

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Imagem: Freepik

Ofereça ensino de alto nível a todos

Ao realizar um estudo com escolas na Inglaterra, Jo Boaler descobriu a importância de oferecer um ensino de alto nível a todos os estudantes, sem classificá-los. Aos 16 anos, os ingleses prestam um exame final de matemática, separado em dois níveis. No nível superior podem alcançar qualquer nota de A a D. No inferior a prova é mais fácil, mas a nota máxima é C. Aos 13 anos, os alunos são classificados, separados e preparados para suas provas, sem chances de um ensino igualitário. Porém uma escola decidiu abolir a separação por níveis e inscreveu os alunos na prova mais difícil. As taxas de A a C saltaram de 40% para 90%. Uma mensagem positiva e uma oportunidade de ensino fez toda a diferença.

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Imagem: Freepik

As pesquisas da professora de Stanford indicam que os estudantes com mentalidade de crescimento são capazes de desprezar mensagens estereotipadas e obter bons resultados, como ocorre na escola Life Academy, em Oakland, na Califórnia (EUA), comprometida na promoção da equidade. Formada por alunos etnicamente diversos em uma área violenta da cidade, a escola oferece um ensino de alto nível e busca inspirar os estudantes a se identificarem como futuros universitários. O colégio tem a taxa de aceitação universitária mais alta da cidade, com uma proporção de alunos 87% maior do que colégios de regiões nobres. Fica enfraquecido o estereótipo de que condições sociais desfavorecidas impedem bons desempenhos. 

Foque em mensagens positivas 

Em uma outra pesquisa, Jo Boaler observou que meninas, mais do que meninos, desejam uma profundidade de compreensão que normalmente está indisponível na aula de matemática. Assim, como não podem obtê-la, apresentam um rendimento mais baixo de sua capacidade e afastam-se da matéria.

Há também uma cadeia de mensagens negativas entre professoras e mães, fonte de identificação para as meninas. Se uma professora afirma que a matemática é difícil para alunas, ou mães dizem que não eram boas de matemática na escola, como será o desempenho dessas crianças? 

Nesse universo elitista, branco e masculino, Jo Boaler defende que mensagens ponderadas e positivas são necessárias para mulheres, não brancos e outras minorias. Eles precisam mais do que os outros por causa dos estereótipos que a disciplina (e toda a sociedade) propaga. 

“Alguns estudantes enfrentam barreiras e desvantagens adicionais e devemos enfrentá-las para alcançarmos uma sociedade mais equitativa. Os professores precisam usar mensagens solidárias como você é capaz, acredito em você, matemática é uma questão de esforço”, afirma a professora.

Leia também: 4 livros sobre matemática e equidade para professores

Valorize o trabalho em grupo

O trabalho em grupo é outro ponto fundamental para o desenvolvimento e inclusão. Boaler cita Rachel Lotan, também de Stanford, que defende a existência de classes mais heterogêneas e os trabalhos em grupo como estratégia para a equidade no ensino. Para conhecer algumas medidas de Rachel que podem colaborar para trabalhos em grupo produtivos na escola, clique aqui.

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Imagem: Freepik

Outro pesquisador que estudou o tema é o matemático Uri Triesman. Quando estudava na Universidade de Berkeley (EUA), verificou que 60% dos estudantes afro-americanos reprovavam em cálculo, enquanto os sino-americanos tinham notas excelentes. Por quê? O pesquisador descobriu uma diferença cultural: os filhos de chineses estudavam em grupo, enquanto os negros estudavam sozinhos. Os primeiros obtinham apoio frente às dificuldades. O professor então criou oficinas cooperativas de matemática em que os estudantes trabalhavam juntos e recebiam mensagens positivas sobre seu potencial. As taxas de reprovação caíram a zero em dois anos.

Fim da lição de casa

O PISA (Programa Internacional de Avaliação de Estudante) estudou a relação entre deveres de casa, desempenho e equidade. A primeira constatação foi que países com mais tarefas de casa de matemática tinham pontuação geral menor. Outra questão levantada é que o dever de casa aumenta a iniquidade. Estudantes de famílias menos privilegiadas dificilmente possuem um lugar tranquilo e isolado para estudar e têm menos acesso a livros e internet. As tarefas de casa criam um obstáculo aos que mais precisam de apoio. “A meu ver esse fato é suficiente para considerar o dever de casa indefensável”, diz Jo Boaler. 

Leia também: Exemplos inspiradores de educação equitativa

Vamos começar?

Jo Boaler ressalta que não é culpa dos professores que essa cultura elitista tenha permeado a matemática, pois os professores, quando alunos, foram julgados por pontos de desempenho. A culpa está em nossa cultura. É urgente que a matemática passe a ser uma matéria aberta focada em aprendizagem, tanto para estudantes bem-sucedidos quanto para malsucedidos, a quem estamos negando o acesso a ideias que são plenamente capazes de entender. A educadora afirma:

“Quero viver em um mundo em que todos possam aprender e apreciar matemática, e no qual todos recebam encorajamento independentemente da cor de sua pele, de seu gênero, de sua renda, de sua sexualidade ou de qualquer outra característica.”

O programa Mentalidades Matemáticas, criado por Jo Boaler, leva em conta todos esses valores que prezam pelo ensino equitativo. Clique aqui e conheça mais sobre a iniciativa, trazida para o Brasil pelo Instituto Sidarta. Vamos juntos nessa revolução?


Mentalidades Matemáticas

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